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CSM | SP: Doação conjuntiva. Inexiste direito de acrescer se a doação foi feita a apenas um dos cônjuges. Ainda que casados em regime de comunhão. Necessidade de inventário e partilha na hipótese

Atualizado: 17 de mai.

DOAÇÃO. DIREITO DE ACRESCER . AVERBAÇÃO. COMPRA E VENDA. REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL. CÔNJUGE PRÉ-MORTO. PARTILHA - REGISTRO PRÉVIO.


CSMSP - APELAÇÃO CÍVEL: 1007244-07.2023.8.26.0438

LOCALIDADE: Penápolis DATA DE JULGAMENTO: 25/04/2024 DATA DJ: 06/05/2024

RELATOR: Francisco Loureiro


REGISTRO DE IMÓVEIS - NEGATIVA DE REGISTRO DE ESCRITURA DE COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL - RECUSA FUNDADA NA NECESSIDADE DE PRÉVIO INVENTÁRIO DE BENS DEIXADOS PELO CÔNJUGE - DIREITO DE ACRESCER NÃO OCORRENTE NA ESPÉCIE - DOAÇÃO REALIZADA EXCLUSIVAMENTE EM FAVOR DOS FILHOS, E NÃO DE SEUS CÔNJUGES - MANCOMUNHÃO SOBRE O IMÓVEL DOADO QUE DECORRE DO  REGIME DE BENS DO CASAMENTO E NÃO DE EFEITOS PRÓPRIOS DA DOAÇÃO - INAPLICABILIDADE DO ART. 551, PARÁGRAFO ÚNICO DO CÓDIGO CIVIL - SENTENÇA MANTIDA - APELAÇÃO NÃO PROVIDA.


Trata-se de apelação interposta por MADALENA MIRANDA GOMIDE contra a r. sentença proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis de Penápolis, que, em dúvida suscitada, manteve a recusa de registro da Escritura Pública de Venda e Compra do imóvel de matrícula nº 29.539 daquela serventia, exigindo a realização de inventário e partilha dos bens deixados pelo cônjuge falecido, Nilsen Arruda Gomide (fls. 73/75).


A apelante pretende, em síntese, seja reconhecido o direito de acrescer com fundamento no artigo 551, parágrafo único, do Código Civil, dispensando-se a abertura de inventário pelo falecimento de seu marido. Nestes termos, requer a reforma da r. sentença, com ingresso do título no fólio real (fls. 76/83).


A Douta Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 114/116).


É o relatório.


A recorrente apresentou a registro a Escritura Pública de Venda e Compra, lavrada pelo 1º Tabelionato de Notas de Penápolis (livro 439, fls. 295/298), em que Madalena Miranda Gomide e outros venderam a Acir Vieira de Miranda e a sua esposa Maria Constância Baffile de Miranda, uma parte ideal de 80% de uma propriedade composta de 3,6281 hectares, da gleba denominada 1, objeto da matrícula 63.295, procedente da matrícula nº 29.539, objeto da Retificação Consensual nº 48/22 de 01 de abril de 2022.


Como esclareceu o Oficial, Madalena comparece na referida escritura na condição de viúva, requerendo que seja acrescida ao seu patrimônio a parte que seria de seu falecido cônjuge, com invocação do disposto no artigo 551, §1º, do Código Civil Brasileiro, com o que o delegatário não concordou, como explicitado na nota de devolução nº 208.100 (fls. 120), que, vencida, ensejou a posterior nota nº 211.439 (fls. 119):


"- Necessário apresentar o CCIR 2022 e comprovante de quitação.

- O acréscimo requerido pela vendedora Madalena não pode ser feito tendo em vista que a parte recebida por doação de seus pais foi feita a ela casada com Nilson e não ao casal, nesse caso não se aplica o direito de acrescer, previsto no art. 551 - § 1º do código civil."


A recusa do Oficial deve prevalecer.


O direito de acrescer entre cônjuges está previsto no parágrafo único do artigo 551 do Código Civil, cujo teor transcrevo:


"Art. 551. Salvo declaração em contrário, a doação em comum a mais de uma pessoa entende-se distribuída entre elas por igual.
Parágrafo único. Se os donatários, em tal caso, forem marido e mulher, subsistirá na totalidade a doação para o cônjuge sobrevivo".

Da leitura do dispositivo legal, conclui-se que na doação feita aos cônjuges, isto é, ao casal, subentende-se estabelecido o direito de acrescer, de modo que, falecido um dos cônjuges, o imóvel passa a pertencer na totalidade ao cônjuge sobrevivente, não integrando o acervo hereditário.


Nesse sentido é o ensinamento de Maria Helena Diniz, em comentário ao art. 551, na obra Código Civil Anotado, São Paulo: Editora Saraiva, 18ª Edição, pág. 505:


"Se os beneficiários são marido e mulher (casal donatário), a regra é a do direito de acrescer: a doação subsistirá, na totalidade, para o cônjuge sobrevivente (RJTJSP, 138:105; RT, 677:218) não passando a parte do bem doado, cabível ao de cujus ao acervo hereditário, nem aos herdeiros necessários".

A hipótese vertente é semelhante à apreciada nos autos do Recurso Administrativo nº 1000010-77.2017.8.26.0019, em que o parecer da lavra do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, Dr. Paulo Rogério Bonini, foi acolhido pelo então Desembargador Corregedor Geral da Justiça, Dr. Ricardo Mair Anafe, onde ficou expressamente consignado que:


"O fato de haver doação a um dos cônjuges que, por força do regime de bens, irá se integrar a comunhão, não indica desnecessidade de liquidação da meação e dos bens particulares do cônjuge falecido, formando-se, a um só tempo, a meação do cônjuge sobrevivente e a herança partilhável. A tese confunde os efeitos de cláusula contratual decorrente da doação em favor de ambos os cônjuges com os efeitos do regime de bens em relação ao bem doado a um só deles.
Se a recorrente era casada pelo regime da comunhão universal de bens e recebeu, individualmente, doação sem a imposição de cláusula de incomunicabilidade, houve natural comunhão sobre o bem e, com o falecimento de seu cônjuge, deverá a mancomunhão ser liquidada para fins de aferição da meação sobre o bem comum e da parte legítima dos herdeiros. Neste sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, apreciando recurso especial em processo que discutir a mesma questão apresentada na tese recursal:
Civil. Recurso especial. Inventário. Imóvel obtido pelo falecido mediante doação. Único donatário. Subsistência da doação em relação ao seu cônjuge, com base no art. 1178, parágrafo único  do CC. Impossibilidade. - A aplicação do art. 1178, parágrafo único do CC, no sentido de subsistir a doação em relação ao cônjuge supérstite, condiciona-se ao fato de terem figurado como donatários marido e mulher. No contrato de doação, se apenas o marido figura como donatário, ocorrendo a morte deste, eventual benefício à mulher somente se configurará se o regime de bens, estabelecido no matrimônio, permitir. Recurso especial não conhecido. (STJ Resp 324.593/SP 3ª T. rel.ª Min.ª Nancy Andrighi j. 16.09.2003 DJ 01.12.2003).
Do teor do voto, colhe-se a seguinte posição:
'Por outro lado, se na doação figura como donatário somente o marido ou a mulher, em razão de sua morte serão os seus herdeiros beneficiados. Nessa hipótese, poderá o cônjuge supérstite, caso exista, ser ou não beneficiado em razão do regime de bens adotado no matrimônio. Adotado o regime de comunhão de bens, o bem doado acrescerá a meação do cônjuge supérstite, nos termos do art. 263, II do CC, se no contrato de doação não restou lançada cláusula de incomunicabilidade. A respeito da questão, assim se pronunciou o mestre Pontes de Miranda: 'No art. 1178, parágrafo único, estabelece-se o direito do cônjuge sobrevivo à totalidade da doação. Nada tem isso com a sorte da doação confirme o regime matrimonial de bens. O que o parágrafo único faz entender-se é que, se os donatários são cônjuges, a parte do cônjuge que premorre passa ao sobrevivo. Nada tem isso com a doação a um dos cônjuges, se o regime é da comunhão de bens, ou outro regime. O parágrafo único supõe pluralidade, aí duas pessoas, que foram os outorgados, e em atenção à situação jurídica entre eles estatui que toda a doação vai ao que está vivo. Se já a haviam recebido, não há invocabilidade do parágrafo único.' (Tratado de Direito Privado Parte Especial, Tomo XLVI, Ed. Borsoi, Rio de Janeiro, 1964, p. 237)."

Na espécie, não houve doação ao casal, mas apenas a Madalena, quando era casada pelo regime da comunhão universal de bens.


A procedência da propriedade de Madalena está no R.01 da matrícula nº 29.539, em que ela recebeu, em doação, juntamente com seus irmãos, uma parte ideal do referido imóvel.


Confira-se o R.01 da matrícula nº 29.539:


"Por escritura pública lavrada no 1º Tabelionato de Notas local, em 10 de setembro de 1999, no livro 257, fls. 163/164, o proprietário Augusto Vieira de Miranda, acima qualificado, transmitiu a título de doação à seus filhos: MADALENA MIRANDA GOMIDE (...) casada sob o regime da comunhão de bens, antes da Lei 6.515/77, com NILSEN ARRUDA GOMIDE (...); HAMILTON VIEIRA DE MIRANDA (...) casado  sob o regime da comunhão de bens, antes da Lei 6.515/77, com BALBINA PRANCISCA PAES DE MIRANDA (...); ACIR VIEIRA DE MIRANDA (...) casado sob o regime da comunhão  de bens, antes da Lei 6.515/77,  com MARIA CONSTÂNCIA BAFFILE DE MIRANDA (...); EURIDES VIEIRA DE MIRANDA CUNHA (...) casada sob o regime da comunhão de bens, antes da Lei 6.515/77, com RUBENS CUNHA (...); AMIR VIEIRA DEMIRANDA (...) casado sob o regime da comunhão de bens, antes da Lei 6.515/77, com MARIA ELENA MUNHOZ MIRANDA (...) o imóvel objeto desta matrícula (...)" (grifo nosso).


Como se vê do registro em apreço, a doação foi feita pelo genitor a seus filhos, e não a seus filhos e correspondentes cônjuges.


Desta forma, Madalena recebeu sua parte ideal do imóvel por doação de seu pai, quando estava casada com Nilsen Arruda Gomide, sob o regime da comunhão universal de bens, hipótese que não dá ensejo ao direito de acrescer entre cônjuges previsto no parágrafo único do artigo 551 do Código Civil. Somente, portanto, em casos de doação expressa ao casal é que há incidência da regra do citado dispositivo legal.


No caso, a doação foi feita exclusivamente a Madalena e a seus irmãos, não incluindo os correspondentes cônjuges, como já destacado.


Assim, não há que se falar em incidência da regra do art. 551, parágrafo único, do Código Civil à hipótese vertente.


Diante do falecimento do cônjuge de Madalena, necessária a partilha de bens para que seja dado destino ao seu patrimônio.


Nesse sentido, é o entendimento da Corregedoria Geral de Justiça de São Paulo:


"REGISTRO DE IMÓVEIS - RECORRENTE QUE PRETENDE, DEPOIS DE AVERBADO NA MATRÍCULA O ÓBITO DE SEU CÔNJUGE, COM QUEM ERA CASADA SOB O REGIME DA COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS, SEJA TAMBÉM AVERBADA A SUBSISTÊNCIA, EM SEU FAVOR, DA TOTALIDADE DA PARTE IDEAL DO IMÓVEL RECEBIDO POR DOAÇÃO - NEGATIVA DE AVERBAÇÃO, COM EXIGÊNCIA DE QUE A PARTE CABENTE AO FALECIDO SEJA LEVADA  A INVENTÁRIO - DOAÇÃO REALIZADA EXCLUSIVAMENTE EM FAVOR DO CÔNJUGE FALECIDO - INAPLICABILIDADE DO DISPOSTO NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 551 DO CÓDIGO CIVIL ÓBICE MANTIDO - RECURSO  NÃO PROVIDO." (Parecer 10/2024-E, Processo CG nº 1005259-37.2022.8.26.0438, Juíza Assessora da Corregedoria Geral da Justiça Maria Isabel Romero Rodrigues Henriques, aprovado pelo E. Des. Francisco Eduardo Loureiro, em 19/01/2024).

"REGISTRO DE IMÓVEIS - Recorrente que pretende, depois de averbado na matrícula o óbito de seu cônjuge, com quem era casada sob o regime da comunhão universal de bens, que seja também averbada a subsistência, em seu favor, da totalidade da parte ideal do imóvel recebido por doação - Negativa de averbação, com exigência de que a parte cabente ao falecido seja levada a inventário - Doação realizada exclusivamente em favor da recorrente, filha dos doadores, e não em favor dela e seu marido - Inaplicabilidade do disposto no parágrafo único do art. 551 do Código Civil - Mancomunhão sobre o imóvel doado que decorre do regime de bens do casamento e não de efeitos próprios da doação - Óbice mantido - Recurso não provido." (Parecer 113/2020-E, Processo CG 1000013-32.2017.8.26.0019, Parecer MM Juíza Auxiliar da Corregedoria Stefânia Costa Amorim Requena, aprovado pelo E. Des. Ricardo Mair Anafe, em 13/03/2020).

Outra solução, aliás, não poderia ser dada ao caso concreto porque recentemente, sob minha relatoria, foi julgado recurso da mesma interessada, com idêntica postulação, mas com referência a outro imóvel, cuja ementa ora se destaca:


"REGISTRO DE IMÓVEIS - NEGATIVA DE REGISTRO DE ESCRITURA DE COMPRA E VENDA DE BEM IMÓVEL - RECUSA FUNDADA NA NECESSIDADE DE PRÉVIO INVENTÁRIO DE BENS DEIXADOS PELO CÔNJUGE - DIREITO DE ACRESCER NÃO OCORRENTE NA ESPÉCIE - DOAÇÃO REALIZADA EXCLUSIVAMENTE EM FAVOR DOS FILHOS, E NÃO DE SEUS CÔNJUGES - MANCOMUNHÃO SOBRE O IMÓVEL DOADO QUE DECORRE DO REGIME DE BENS DO CASAMENTO E NÃO DE EFEITOS PRÓPRIOS DA DOAÇÃO - INAPLICABILIDADE DO ART. 551, PARÁGRAFO ÚNICO DO CÓDIGO CIVIL - SENTENÇA MANTIDA - APELAÇÃO NÃO PROVIDA" (Apelação nº 1007246-74.2023.8.26.0438; Conselho Superior da Magistratura; data do julgamento: 08 de março de 2024).

Correta, portanto, a recusa do registrador pelo ingresso do título no fólio real.


Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.


FRANCISCO LOUREIRO

Corregedor Geral da Justiça

Relator


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